Eleições, marketeiros e projeteiros

por Onevair Ferrari em 10.11.2014

A campanha política acabou. Foi trabalho duro para um tipo de profissional que já tem o reconhecimento, o respeito e a devida remuneração dos políticos: os assim chamados marketeiros. Candidatos e candidatas os seguem cegamente, depositando em suas mãos a difícil tarefa de vender imagens e sonhos que sensibilizem o eleitor e a eleitora. Nesta arena, parecer é muito mais importante do que ser e cabe a eles destacar o lado da verdade que interessa e transformar inverdades em certezas incontestáveis. Para vender o candidato eles exploram as necessidades e os desejos dos eleitores, muitas vezes de forma inescrupulosa.

Transformar medíocres em superdotados, corruptos em benfeitores, víboras em gazelas, não é para ilusionistas principiantes. As técnicas ludibriantes exigiram muitos neologismos eufemísticos para amenizar históricos desfavoráveis e anestesiar a precariedade de nosso país: malfeitos (crimes), operador (doleiro), contraventor (bicheiro), contabilidade criativa (fraude), alquimia fiscal (sonegação), terceirização da responsabilidade (jogar a culpa em alguém), cultura da responsabilidade diluída (não é culpa de ninguém), embargos infringentes (isenção geral) e assim por diante, em tantos exemplos plantados na mídia a cada dia.

Mas este pessoal já fez seu trabalho e deve estar gastando seus dólares em algumas paragens mais civilizadas, com água em abundância, segurança, educação, saúde, infraestrutura, portanto bem longe desta nossa suíça tropical que eles criaram no imaginário coletivo dos desavisados. O choque de realidade pós-campanha está se encarregando, porém, de nos livrar do perigo das mentiras duráveis, já que muitas das criações não se sustentam.

Agora deveria entrar em cena, um outro tipo de profissional, capaz de transformar as ideias factíveis em resultados: os projeteiros (criei o termo por analogia, sabendo que desagradará aos colegas Gerentes de Projetos).

Os governantes ainda não reconheceram os Gerentes de Projetos e ainda não os transformaram em projeteiros. Talvez, por isso mesmo, haja tantos projetos interrompidos e tantos recursos públicos desperdiçados, evidenciando a incompetência do poder público em entregar. É gritante a incapacidade de gerenciamento da maioria dos entes públicos.

Mas as eleições mostraram que os tempos do persistente conformismo que permeou as últimas décadas podem estar chegando ao fim. Os governantes terão que assumir seu papel de realizadores e os cidadãos que pagam impostos terão que assumir seu papel de interessados, acompanhando as ações de seus eleitos, monitorando as promessas e os resultados, cobrando coerência, protestando e elogiando quando for o caso.

Nesses novos tempos, os governantes terão que agir como patrocinadores de programas e projetos de desenvolvimento, melhoria e transformação do país. A missão de realizar deverá ser delegada não mais a apadrinhados e sim para gente competente, capaz de planejar, executar, controlar e entregar resultados. Enfim, promover ordem para conseguir progresso.

Lições aprendidas não faltam, mesmo que a teimosia cega impeça os eleitos – e as eleitas estarrecidas – de reconhecerem os desvios. O país dos estádios não tem educação, saúde, segurança, infraestrutura. Muitos projetos ficaram pelo caminho.

Porque os governantes não entregam? Certamente há muitos interesses em jogo, mas já não há mais espaço para incompetência e fatalismo. Com a competência de quem sabe fazer e a atenção dos contribuintes é possível blindar estas transformações necessárias dos interesses escusos. É preciso manter a indignação para que não volte o conformismo. O Brasil do fome zero agora tem fome de educação, saúde, segurança, infraestrutura. O Brasil tem fome de realizações.

Os marketeiros criaram os sonhos. Agora são os gerentes de projetos que podem ajudar a realizá-los, transformando o país dos sonhos no país das realizações.

Onevair Ferrari, DSc, MSc, PMP é professor, consultor, palestrante, coach em Gerenciamento de Projetos e diretor da Nexor.
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